
Lenilson Guedes
Ex-prefeito de Picuí
e presidente da Famup, Buba Germano diz que a lei da transparência só é
rigorosa para os municípios. “Que lei é essa que só serve para um ente menor e
o mais importante? É uma lei que é amena para os Estados e que inexiste para a
União”, questiona. Em entrevista exclusiva ao JORNAL DA PARAÍBA, ele disse que
os municípios são os mais prejudicados com a situação econômica do país e
criticou a falta de sensibilidade da presidente Dilma para os problemas da seca
no Nordeste. “Talvez a presidenta Dilma não tenha sensibilidade, por não ser
nordestina, do que representa o problema da seca”, afirmou.
JORNAL DA PARAÍBA -
Além da seca, que outros problemas graves enfrentam os municípios paraibanos?
Buba Germano -
Hoje o principal problema é o desequilíbrio financeiro. No primeiro
quadrimestre, toda projeção feita pelo governo federal com relação à
disponibilidade de recursos financeiros para os municípios não foi cumprida.
Até o mês de abril nós tivemos apenas 4% de crescimento com relação à distribuição
de FPM (Fundo de Participação dos Municípios). Em contrapartida, os municípios
tiveram quase 8% de aumento do salário mínimo. Há uma sobrecarga financeira
muito grande e sem o equilíbrio financeiro não podemos executar os serviços
públicos. O maior problema, hoje, é a questão da distribuição financeira. O
país passa por uma crise, isso é notório, e nós como cidadãos brasileiros não
torcemos pelo aumento da inflação. Agora, todos os mecanismos que o governo faz
para controlar a parte do governo, como por exemplo, os incentivos de IPI da
linha branca, de veículos, são importantes porque mantêm o emprego nas
indústrias. Por outro lado, subtrai dos repasses de recursos de Estados e
municípios. Nós vivemos numa federação que concentra renda em quem não executa
serviços, que é a União. Temos três entes federados e os municípios são
penalizados porque a responsabilidade de transferência do dia a dia de rotina
de um município é muito grande, como na saúde e na assistência ao cidadão.
JP - O senhor acha que
a situação é de falência dos municípios?
Buba - Eu não diria de
falência, porque na verdade nós também não podemos ficar reclamando, mas de
desarticulação total. Vai chegar a um ponto em que, assim permanecendo, vai
inviabilizar as gestões públicas. Isso não é um problema exclusivamente do
Brasil, essa é uma discussão em nível mundial, do fortalecimento dos
municípios. Eu estou vindo de um encontro internacional no México, onde os
países ibero-americanos discutem exatamente essa relação entre os entes
federados. O Pacto Federativo é, na prática, mais recursos em quem executa. Nós
não podemos usar nunca a prerrogativa de que os poderes municipais são
corruptos, porque se a corrupção existe, ela vai existir onde tem mais
recursos, na União, que fica com 74% do bolo tributário nacional.
JP - Em termos de
números, o senhor tem ideia de quanto os municípios estão perdendo
financeiramente?
Buba - Todos os
municípios perdem. Só para citar um exemplo, a Paraíba perdeu quase R$ 30
milhões da desoneração de IPI de veículos. Os dois componentes que fazem o FPM
são exatamente o Imposto de Renda e o IPI. Quando o governo dá um incentivo,
ele poderia dar das contribuições que tem, da DRU (desvinculação de receita da
União), dos mesmos recursos que ele aplica no Bolsa Família, no Garantia Safra,
no Seguro Estiagem. Esses recursos não têm carimbo, é prerrogativa da
presidente, que por uma Medida Provisória, destina para onde quer. Mas nós
estamos insistindo há um ano sobre um apoio financeiro para a gente enfrentar
essas questões da estiagem e da seca. Essa semana estaremos mais uma vez em
Brasília, traçando a pauta da próxima marcha de prefeitos, que será nos dias 9,
10 e 11 de junho, para discutir essa relação. Talvez a presidenta Dilma não
tenha sensibilidade, por não ser nordestina, do que representa o problema da
seca. A seca interfere diretamente na economia do país. A redução do nosso
rebanho causa um prejuízo terrível para o nosso Estado, que para regularizar a
situação, vai ter que resgatar rebanho de fora para repor essa perda de quase
60% do rebanho paraibano.
JP - Os ataques a
bancos têm se intensificado no interior da Paraíba, o que mostra que a
violência também está presente nas pequenas cidades. Como a Famup vê essa
situação?
Buba - Entendemos que
essa questão é um problema nacional. A rigor, a Constituição estabelece ser
prerrogativa da União e dos Estados tratar de segurança e quem menos teria
responsabilidade são os municípios, mas é no município onde vive o cidadão. As
autoridades competentes deverão tomar as providências.
JP - O Tribunal de
Contas tem orientado os prefeitos a não exagerarem nos gastos com festas
juninas em função de que alguns municípios decretaram estado de emergência por
causa da seca. Em sua opinião, há como fazer festa mesmo havendo essa situação
da seca?
Buba - Eu sempre defendi
a preservação do calendário de eventos dos municípios. A festa junina faz parte
de um calendário nacional e o Nordeste tem essa tradição. Agora, eu defendo que
o município faça a festa compatível com o que é possível gastar. Eu posso dar
um exemplo como ex-gestor de Picuí, que tem a festa da carne de sol. Eu nunca
comprometi o erário do município para fazer o evento. Sempre fiz do tamanho que
ele comportava. Significa dizer que nós temos alternativas. Se todos os
gestores quiserem prestigiar a cultura popular vamos contratar os artistas
paraibanos, porque isso se consegue com um cachê mais barato, além do que a
gente está valorizando a arte popular do nosso Estado.
JP - O que o senhor
acha da terceirização em serviços essenciais como saúde e educação. Já temos
essa experiência no governo do Estado e agora na prefeitura de Campina Grande.
Buba - Nós somos a favor
da terceirização, até porque tem serviços que realmente não temos a capacidade
de gerenciar. Posso citar alguns exemplos. O governo federal tem uma política
de creches. Só o incentivo para construir a creche não é suficiente para que a
gente mantenha as nossas crianças na escola, e a manutenção é caríssima. Quando
fui prefeito de Picuí, terceirizei os serviços de saúde e por isso Picuí é hoje
o segundo colocado no ranking do índice SUS, que são indicadores da atenção
básica. Eu não tinha condições, por exemplo, de ter um tomógrafo em Picuí e
tive que terceirizar. No serviço público, não temos pessoal qualificado para
mexer qualquer equipamento de alta e média complexidade. Na hora que acontece
qualquer problema numa máquina dessa não temos como imediatamente resolver,
porque tem de abrir processo licitatório e uma série de complicações da
administração pública que não permitem que você tenha celeridade. Se o serviço
é terceirizado você paga por produção. Hoje o único exame que não fazemos na
região do Curimataú é de ressonância magnética. Todos os outros são realizados
no município de Picuí de forma terceirizada. Agora existem regras para um processo
de terceirização e a nossa recomendação é que se faça uma chamada pública.
JP - O Fórum de Combate
à Corrupção apresentou um levantamento dos municípios que estão cumprindo a lei
da transparência, no sentido de divulgar em tempo real as suas despesas. Como a
Famup acompanha esse processo?
Buba - A Famup tomou a
liberdade, como entidade representativa de todos os municípios, de procurar a
CGU e o TCE. Dialogamos com os responsáveis das respectivas instituições e
criamos a nossa própria ferramenta de forma gratuita para os municípios. Hoje
nós temos o portal da transparência para que os gestores publicizem suas
despesas. Eu queria fazer uma ressalva com relação a isso aí. O que a maioria
dos gestores questiona é que, para a opinião pública, vai a impressão de que
somos nós prefeitos que não queremos a transparência. Isso não é verdade. A lei
da transparência é nacional e ela tem que ser aplicada para todo e qualquer
ente que use recurso público. Não é lei criada só para os municípios. Qual é o
grande questionamento que se faz? É porque a lei é muito rigorosa para os
municípios, ela é amena para os Estados e inexiste para a União. Que lei é essa
que só serve para um ente menor, e o mais importante?
Fonte: Jornal da Paraíba.com.br
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